Modelo para a universidade
"Todos já visitamos as salas dos professores algum dia, não é mesmo? Já reparou como amontoam papéis, livros, estantes, mesas, cadeiras, lustres, cinzeiros, computadores, impressoras, armários, poeira, sujeira, mofo? Quando terminam de bagunçar a própria sala, os anexos e laboratórios de um bloco inteiro, constroem blocos novos (vide bloco D). E o lixo continua aumentando, astronomicamente. Salas 'equipadíssimas': sem ventilador, sem retroprojetor, sem tomadas que funcionem, sem giz, sem lousa limpa, sem lixeira, sem porta, sem luz, sem ventilação. E nós, alunos, não pedimos nada de absurdo. Apenas papel higiênico nos banheiros, sabonete, espelho, quem sabe." Trechos de uma crônica arrasadora de J. D. Borges, quintanista de elétrica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, sobre sua faculdade, uma das mais reputadas do país. Esse ambiente é quase padrão na universidade e nos institutos de pesquisa públicos, e denota um caso típico de carência de gerência. Na raiz da questão está a estrutura burocrática e de comando. A conquista da autonomia universitária e a implantação do tempo integral nas universidades profissionalizaram a carreira e livraram a universidade pública de influências espúrias externas, mas não das internas. Acabaram deixando a universidade fora do alcance das influências legítimas, sem nenhum parâmetro de controle externo. Nós a serem rompidos A questão é que a universidade e os institutos públicos têm papel fundamental em qualquer cenário de política científica e tecnológica. Os salários pagos são aviltantes, conservando na universidade pública apenas os abnegados e os acomodados, ou os que lograram fincar estruturas de poder nos departamentos. E o dinheiro investido é mal aplicado porque tratam-se de organizações primárias, no plano gerencial. Um dos pontos centrais a ser derrubado é a estrutura profissional da universidade. Todos os professores estão subordinados ao Regime Jurídico Único, que não permite diferenciações nem promoções por mérito. Misturam-se no mesmo balaio competentes e acomodados. Não se aceitam administradores externos nos departamentos. Com isso, ou colocam-se à frente dos departamentos professores políticos, ou pesquisadores que vão para o sacrifício, por não disporem nem de formação nem de aptidão gerencial. O resultado final é uma estrutura gerencialmente anacrônica, que afeta toda a produção acadêmica. Não se adotam programas de treinamento para funcionários e auxiliares, nem metas de produtividade. Não se cuida de buscar infra-estrutura e financiamento para a pesquisa, convênios com empresas, deixando os pesquisadores à mercê da desorganização e da falta de recursos. Nas eleições, há uma ênfase ao populismo, mais acentuada nos tempos em que os funcionários tinham peso maior no Colégio Eleitoral. E usa-se como álibi geral a falta de verbas públicas. Organizações sociais Criadas para conferir maior flexibilidade às universidades, as fundações deixam a desejar. Muitas naufragaram na própria falta de aptidão gerencial de seus membros e de controles externos. O que se pensar, daqui por diante, deverá passar pelas estruturas mais flexíveis das Organizações Sociais (OS), previstas no plano de Reforma de Estado do ministro Bresser Pereira. Seriam organizações autônomas, reguladas por conselhos externos de contribuintes e clientes, recebendo do Estado de acordo com sua produção. É de Rui Rothe-Neves, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma proposta objetiva. Ele propõe que o professor Vicente Falconi Campos, do Grupo de Qualidade da Fundação Christiano Ottoni, com sua experiência gerencial e utilizando as mais modernas ferramentas de gestão, prepare um plano de reestruturação de uma universidade qualquer -"a UFMG, por exemplo"-, mas em bases reais, para não se pensar que são metas inatingíveis. Diz ele: * o plano deverá se basear na possibilidade jurídica aberta com a MP que cria as "organizações sociais", que permite às universidades fazerem o que sabem (ensino, pesquisa e extensão) e pagar pelo que não sabem (administrar); * desçamos ao nível de estabelecer quantos funcionários/seção e quantas seções são necessárias; * o projeto de reestruturação mesmo pode ser vendido para parceria com um capitalista de risco, que teria como contrapartida o direito de administrar as organizações sociais que forem saindo do papel; * não precisamos transformar tudo em uma única e gigantesca OS. Podemos fazer aos pedaços, como se fez com o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, da Unicamp; * em torno de um projeto consistente, podemos partir para uma mobilização dos professores que não estejam satisfeitos com o resultado oferecido por uma estrutura que privilegia a política e considera o aumento de verbas (que não deve vir, é bom que se diga, pois temos o dever cidadão de investir de forma maciça na educação básica ) a única maneira de resolver sua inépcia. Luís Nassif P.S. Conheça toda a história do texto e suas repercussões ao longo dos anos baixando o e-book A Poli como Ela é... O Livro. |