Com vocês, os impagáveis Impostos

Tradição Histórica

Quem se lembra de Joaquim José da Silva Xavier, de Cláudio Manuel da Costa, de Tomás Antonio Gonzaga, de Inácio de Alvarenga Peixoto, de José Álvares Maciel, de José de Oliveira Rolim e de Francisco de Paula Freire de Andrade? Pois então. Foram eles presos, desterrados, enforcados, sangrados, esquartejados, tendo suas víceras expostas em praça pública — por fomentar uma revolta que visava, dentre outas coisas, a independência do Brasil de Portugal.

E qual foi o estopim para a eclosão da também chamada Conjuração Mineira? Pois bem. Foi a instituição da Derrama — cobrança forçada do pagamento mínimo de 100 abonos anuais de ouro, oriundos do Quinto (imposto que exigia a quinta parte da produção aurífera da Colônia).

Tirando a ganância e a incopetência — em prestar serviços de saúde, educação, assitência social, segurança pública e previdência —, que permanecem inalteradas, de lá pra cá, pouca coisa mudou no perfil tributarista do Governo.

Para Inglês Ver

Depois de um mês e meio de discussões e duas tentativas de aprovação frustradas (a última em 1995), o Ministério da Fazenda apresentou um roteiro de projeto de proposta de emenda tributária.

Patacoadas à parte, o texto contrariava o principal pressuposto da anunciada reforma: a extinção dos impostos com incidência em cascata. No fim, resultou em hesitante promessa de extinção de complicadores, em mera criação de novas siglas, em compensação de perdas de receita e em garantia do nível recorde de escorchante arrecadação (30% do PIB brasileiro).

"Foi um ato político. A equipe econômica tentou mostrar que tinha uma proposta de reforma, mas ela, na verdade, não existe." (Alexandre Cardoso, deputado pelo PSB do Rio de Janeiro)

Pra Começo de Conversa

A título de rememoração, a atual malha tributária compõe-se, na escala Federal, de: IR (Imposto de Renda), IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), Pis/Pasep, II (Imposto de Importação), IE (Imposto de Exportação), ITR (Imposto Territorial Rural) e Contribuição Previdenciária; na escala Estadual, de: ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores); na escala Municipal, de: ISS (Imposto sobre Serviços), IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e ITBI (Imposto sobre Transmissão de Imóveis).

A título de complementação, o IR incide sobre rendimentos de pessoas físicas e jurídicas; o IPI, em cada etapa da produção industrial; o IOF, sobre empréstimos e financiamentos bancários; o CSLL, sobre os lucros das empresas; a CPMF, sobre os saques bancários; o Pis/Pasep, juntamente com Cofins, sobre o faturamento das empresas; IE e II, nas transações de produtos com o exterior; o ITR, sobre propriedades rurais; a Contribuição Previdenciária, sobre empresas e assalariados; o ICMS, sobre a venda de bens e serviços; o IPVA, sobre o valor de mercado dos veículos; o ISS, sobre os serviços; o IPTU, sobre as propriedades urbanas; ITBI, sobre a venda de imóveis.

Como se toda essa nomenclatura não bastasse, os nossos tecnocratas reaparecem cheios de criatividade (e de dedos) para vampirizar e enlouquecer ainda mais o contribuinte.

Provisório Permanente

A começar pela transformação da "Contribuição Provisória" (CPMF, no início, uma encarnação do Imposto Único) em "Imposto Permanente" (IMF), elevando sua alíquota de 0,20% para 0,38%.

Por recair sobre as movimentações financeiras, é o que há de mais moderno e pernicioso em termos de reação em cadeia. "Nossa bolsa de valores será destruída. Hoje já se negocia muito mais ações da Telebrás em Nova York do que em São Paulo." (Maílson da Nobrega, ex-ministro da Fazenda)

Imposto sobre o Prejuízo

Ainda no universo monetário-financeiro, o IR vaticina que extenderá um pouco mais seus tentáculos; será recolhido também nos fundos de renda fixa e de renda varíavel, semanalmente (não mais na ocasião do resgate).

Fábio de Oliveira, diretor da administração de carteiras do Bank Boston, ressalta, muito oportunamente, o lado trágico da questão: "Se houver desvalorização do fundo (graças a aumentos de juros promovidos pelo próprio governo, por exemplo), o contribuinte, além de perder dinheiro, bancará impostos sobre ganhos que não obteve".

Imposto Verde

Denominado "Seletivo", esse tal promete abocanhar o bolso dos proprietários de carros movidos a gasolina, visto que promoverá uma alta de R$ 0,30 no preço do litro do combustível. (A título de quantificação: quem consome 25 litros por semana, vai desembolsar R$ 30 a mais por mês.)

Seletivo usurpará igualmente os consumidores de bebidas, cigarros e charutos; os usuários de veículos, comunicações e energia; e os entusiastas de outros "produtos supérfluos a serem especificados em lei complementar" (leia-se chiclete de bola, pudim de leite, desodorante, creme dental, lâmina de barbear e balas juquinha).

ICMS versus IVA

E não se fez de rogado o novo e brioso ICMS. Com base ampliada, vai atacar serviços hoje não taxados; tais como: construção civil, hotéis, motéis, alfaiates, tintureiros, faxineiras, lavadeiras, acompanhantes e amas-de-leite. E os bancos não passarão em branco, o novo e vitaminado ICMS pretende incomodar essas instituições também.

(A título de curiosidade: o IVA, Imposto sobre Valor Agregado, surgido como esperança para aniquilar o antigo e conflituoso ICMS, o IPI e o ISS, foi impiedosamente abatido.)

Filantrópica ma non troppo

E o pessoal da CNBB e das PUCs pôs a boca no mundo, por causa da insinuação de tributação das "entidades filantrópicas que cobram pelos serviços prestados" (à comunidade); são elas: escolas, universidades, hospitais, santas-casas, creches e centros de assistência social.

"A Igreja tem muitas obras e cumpre até funções que deveriam ser do Estado. Se passar essa medida, a população carente será muito prejudicada." (Dom Raymundo Damasceno, secretário geral da CNBB, em defesa dos desvalidos)

Pior do que isso, só mesmo o repasse que as escolas e universidades ameaçam promover, caso a medida passe. Assim, na maciota, transferirão o ônus do imposto para as mensalidades dos estudantes. (E quem não tem para quem repassar? Repassa pra quem? Pro bispo?)

Inativos Ativos

E dá-lhe taxa sobre os pensionistas e servidores "desativados" da União. E dá-lhe alíquota de 11% em quem recebe de R$ 500 a R$ 1200 de aposentadoria; e dá-lhe mais 9% para quem estiver além dessa faixa.

(Se a moda pegar, a corte brasiliense estudará cuidadosamente a possibilidade de enquadrar, nesse caso, também os mortos, feridos, encostados, dorminhocos, preguiçosos, matutos e desavisados.) 

Pitta Manda Ver no teu IPTU

Assessorado por seus vereadores e secretários, o prefeito de São Paulo, aproveitando o embalo, apronta uma elevação de 66,6% no Imposto Predial e Territorial Urbano. Alega que pretende cobrir os serviços de limpeza urbana (coleta, varrição, transporte, destinação final, incineração e gerenciamento do lixo), acabando com taxa respectiva (hoje cobrada em separado).

Tal iniciativa provocará crescimento de até 30% no IPTU dos mais abastados. (A título de informação, um imóvel no valor de R$ 100 mil pode vir a custar R$ 1 mil, anualmente, ao seu proprietário.)

Nem Chico Bento Escapa

Se você procura a tranquilidade do campo, fique sossegado porque o Governo também vai te pegar. Os pequenos produtores rurais terão sua contribuição previdenciária aumentada (em até 9 vezes), de acordo com o tamanho da gleba explorada. (Fora o limite mínimo de contribuição de 3% sobre R$1690, por ano, por pessoa que explora a terra.)

À la Carte ou O Descanso dos Justos

Como se pode perceber, tem impostos para todos os gostos, para todo o povo, para toda a sociedade.

Como se não bastasse, temos de aguentar esse abuso hediondo até 2002, quando termina o trato com o FMI.

Enquanto isso, a câmara se prepara para mais um recesso até fevereiro. Afinal de contas, tem trabalhado demais...

J. D. Borges