Escrever é uma arte

Talvez hoje eu não tenha um bom motivo para escrever. Sempre soube que escrever não é o problema, vender o que se escreve este sim - o grande desafio.

Vamos lá, o que eu poderia escrever? Isto fez me lembrar meu terapeuta, sim, um terapeuta – aos 14 anos, na década de setenta, me mudei do interior do sul da Bahia, terra do cacau e de Jorge Amado para a Bahia (como os mais velhos, chamavam a bela Salvador).

Todos os motivos me estimularam a ir para a Bahia, mas para o meu pai, o único era o estudo. Tinha que dar um bom estudo. E eu tinha que estudar, pois eu tinha um puta medo do comunismo. Para um filho de dono de terras, comunismo era sinônimo de nome feio, para mim, estudar era um passaporte, porque se o tal sistema de governo aqui chegasse eu teria que ir pegar na enxada, e nunca fui bom de trabalho braçal.

Para um filho de sergipano, que imigrou na década de trinta, já não era uma boa característica. Afinal filho de tigre tem que nascer pintado, como dizem os sírios-libaneses, que imigraram para o antigo eldorado – o sul da Bahia.

Ah! Sim, o terapeuta. Meu pai como todo homem de terra, aqui não se tinha agricultores – pois o cacau era uma árvore sagrada, de fácil manejo e bons rendimentos. Queria que eu fizesse Agronomia para cuidar dos cacauais.

Que conflito! Logo eu, filho único de homem. É aí que entra o terapeuta. Na época, psiquiatra. No terceiro ano do científico, a grande dúvida: que vestibular fazer. Resolvi me matricular em agronomia na Federal e em administração em duas outras faculdades. Mas a lendária teimosia do taurino me levou a querer passar em todos, pois não queria ser um derrotado natimorto.

Enfim, passei em todos vestibulares, e o conflito continuou. Aí só um psiquiatra, pois meu conflito aumentou e somatizou - dores de cabeça, de estômago, etc. Cheguei a pensar que era um encosto, mas fui numa casa de espíritos e não era.

Precisei mesmo do psiquiatra. E foi lá que ele (o terapeuta) me disse se você não der para nada, pode ser um escritor de romances. Pô! Logo romances, eu não gostava de romances, eu gostava mesmo era da putaria que Jorge Amado me apresentou. Mas não dei ouvidos ao meu terapeuta sobre escrever.

Larguei a agronomia, fui cursar administração sob o pretexto “se eu for um bom administrador, poderei contratar um agrônomo”, e quando o velho morreu, que tive que tomar conta das roças de cacau, não é que o vaticínio deu certo. Talvez tenha sido um capricho de filho.

Não teve bom agrônomo para extirpar uma doença que atacou o cacaual – a famigerada vassoura de bruxa, a tal doença de nome científico: crinipelis perniciosa. E a vassoura perniciosa da bruxa vem varrendo o cacau do sul baiano, e a renda caindo a quase zero.

E, hoje quarentando, eu me pergunto ainda há tempo para o vaticínio do psiquiatra dar certo? Acho que escrever pode ser uma boa saída, melhor vender escritos pode me dar uma boa renda.

E será que eu sei mesmo escrever, ou o terapeuta estava curtindo com a minha cara? Já pensei em escrever livros de auto-ajuda, afinal, é um bom nicho e, se as pessoas não ficarem curadas, pelo mesmo o autor fica rico, veja exemplos, meu caro – Lair Ribeiro, Paulo Coelho.

Ah! Esqueci de dizer, meu ex-terapeuta recentemente me disse, lembra do que eu lhe falei sobre escrever, pelo menos você já tem coisas em comum - Paulo e um sobrenome de bicho. Veja aí - o Paulo Coelho que era parceiro de Rauzito (nome de Raul Seixas aqui na Bahia) já anda em Davos, na Suíça, na Reunião dos Banqueiros. Quem sabe você não poderia estar lá, já que gosta tanto de dinheiro e da Suíça. ( ah! Geneve).

O filha da puta parece que anda me gozando mesmo e há mais de vinte anos. Mas estou pensando seriamente em começar a escrever.

Posso não vender porra nenhuma, mas me divirto um bocado quando acho um motivo para escrever.

Paulo Peixinho